Vou escrever aqui um conjunto de textos que fariam mais sentido no outro blog em que escrevo, o Arquipélago dos Gladiadores, mais dedicado às questões políticas. Mas vai ser aqui mesmo, por dois motivos: primeiro, os gladiadores nos próximos tempos vão estar ocupados com o tema da regionalização; segundo, o que vou escrever aqui não é apenas político - é humano, demasiado humano.
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O grande problema a que me refiro é o de Israel. Ou, melhor dito, o da Palestina. Acho que já é altura de escrever umas coisas sobre o assunto, que é um dos mais determinantes para o nosso futuro.
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Sem a resolução deste conflito, que abarca a questão de Jerusalém (cidade santa para ambos os lados do conflito e, ainda, para os cristãos), não poderemos evoluir muito no combate ao terrorismo. O conflito existente e a situação de Jerusalém são duas "fontes" de terroristas. Enquanto não se resolverem, os terroristas continuarão a emergir por todo o mundo islâmico.
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Por vezes há a tentação para descrever um quadro simplista na origem deste conflito: os judeus foram vitimizados na 2ª Guerra Mundial; os europeus e americanos sentiram-se mal com a perseguição que ao longo de séculos lhes moveram e que culminou com o Holocausto; o Ocidente "oferece" aos judeus um território na Palestina no final dessa guerra.
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Ora não foi bem assim.
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Nota Histórica
Já em 1862 Moisés Hess defendeu a ida dos judeus para a Palestina (foi um dos fundadores do socialismo sionista, que viria a inspirar vagamente os kibbutz e que me despetou o interesse por toda esta história). Mas a primeira grande migração de Judeus para a Palestina dá-se em 1882, quando judeus russos perseguidos nos terríveis "pogroms" de 1880-82 emigram para essa região. Foi a 1ª Aliyah ("ascensão", que é como os judeus chamam à migração para Israel).
Em 1883, Nataniel Birnbaum funda a Khadima, uma associação de estudantes judeus de Viena, Áustria. No ano seguinte, 1884, publica “Auto-Emancipação”, outro marco do movimento. É ele um dos grandes divulgadores do sionismo, o movimento que defende a instauração de um Estado judaico na Palestina.
Em 1890, os judeus representam cerca de 5% da população da Palestina (25.000 em 520.000).
O caso Dreyfus, em França, incrementou o movimento e, em 1897, é realizado o primeiro Congresso Sionista em Basileia, na Suíça, organizado por Birnbaum e por Teodoro Herzl.
Daí em diante o Congresso Sionista passou a reunir uma vez por ano. O movimento chegou a ponderar estabelecer-se noutros locais que não a Palestina (por exemplo, um território africano a ceder por alguma potência colonial europeia). No entanto, no 7º Congresso (1905) a maioria pronunciou-se contra essa hipótese, tendo apontado a Palestina como o seu único objectivo daí em diante. Desde 1905...
Em 1917, durante a 1ª GM, o Ministro dos Negócios Estrangeiros britânico (Arthur Balfour) promete aos judeus o estabelecimento na Palestina de um lar nacional (national home), embora respeitando os direitos dos cidadãos não judeus habitantes na região. Os motivos dessa promessa são alvo de especulação: desde procurar apoio nos Estados Unidos para a causa aliada até irritar o Império Otomano (que era aliado dos alemães e ocupava a Palestina), passando pela angariação de apoio entre judeus abastados para o esforço de guerra britânico, várias têm sido as explicações avançadas (provavelmente todas têm algo de verdadeiro). Embora considerada como um primeiro passo, a Declaração Balfour, como ficou conhecida, era prudente: falava em lar nacional (e não em Estado ou país).
Com o fim da 1ª GM e a derrota do Império Otomano, aliado dos alemães, a Palestina fica sob mandato britânico (British Mandate), de acordo com resolução da Liga das Nações.
A imigração judaica para a zona não pára de aumentar. Em 1922 a população judaica já ultrapassa a cristã (muçulmanos: 528.200 – 77%; judeus: 83.800 – 12%; cristãos: 71.500 – 10%). Em 1925 é criada a Universidade Hebraica de Jerusalém. Em 1936 a Comissão Peel (comissão britânica para decidir o que fazer na região) propõe a criação de um Estado judaico e de um Estado árabe, possivelmente adstrito à Jordânia. Judeus e árabes rejeitam o plano. A Comissão Woodhead, nomeada em 1938, propõe um Estado israelita mínimo (uma pequena faixa costeira com menos de 20 km de largura, representando apenas 5% da Palestina), um Estado árabe e o restante território, incluindo Jerusalém, permanecendo sob mandato britânico. Essa proposta é também rejeitada, sobretudo pelos judeus. Em 1936-38 há violentas insurreições muçulmanas contra a imigração judaica. Os britânicos lançam em 1939 um Livro Branco sobre a questão e restringem bastante essa imigração.
Portanto, o problema de Israel não surge apenas no fim da 2ª GM. Na década de 1930 já muitos milhares de judeus se encontravam na Palestina, sendo já cerca de metade da população em 1945. Desde 1905 que a Palestina era o objectivo único dos sionistas e em 1945 estavam muito perto de o conseguir. Ou seja, dificilmente aceitariam outra solução, na Europa ou noutro continente.
Em 1890, os judeus representam cerca de 5% da população da Palestina (25.000 em 520.000).
O caso Dreyfus, em França, incrementou o movimento e, em 1897, é realizado o primeiro Congresso Sionista em Basileia, na Suíça, organizado por Birnbaum e por Teodoro Herzl.
Daí em diante o Congresso Sionista passou a reunir uma vez por ano. O movimento chegou a ponderar estabelecer-se noutros locais que não a Palestina (por exemplo, um território africano a ceder por alguma potência colonial europeia). No entanto, no 7º Congresso (1905) a maioria pronunciou-se contra essa hipótese, tendo apontado a Palestina como o seu único objectivo daí em diante. Desde 1905...
Em 1917, durante a 1ª GM, o Ministro dos Negócios Estrangeiros britânico (Arthur Balfour) promete aos judeus o estabelecimento na Palestina de um lar nacional (national home), embora respeitando os direitos dos cidadãos não judeus habitantes na região. Os motivos dessa promessa são alvo de especulação: desde procurar apoio nos Estados Unidos para a causa aliada até irritar o Império Otomano (que era aliado dos alemães e ocupava a Palestina), passando pela angariação de apoio entre judeus abastados para o esforço de guerra britânico, várias têm sido as explicações avançadas (provavelmente todas têm algo de verdadeiro). Embora considerada como um primeiro passo, a Declaração Balfour, como ficou conhecida, era prudente: falava em lar nacional (e não em Estado ou país).
Com o fim da 1ª GM e a derrota do Império Otomano, aliado dos alemães, a Palestina fica sob mandato britânico (British Mandate), de acordo com resolução da Liga das Nações.
A imigração judaica para a zona não pára de aumentar. Em 1922 a população judaica já ultrapassa a cristã (muçulmanos: 528.200 – 77%; judeus: 83.800 – 12%; cristãos: 71.500 – 10%). Em 1925 é criada a Universidade Hebraica de Jerusalém. Em 1936 a Comissão Peel (comissão britânica para decidir o que fazer na região) propõe a criação de um Estado judaico e de um Estado árabe, possivelmente adstrito à Jordânia. Judeus e árabes rejeitam o plano. A Comissão Woodhead, nomeada em 1938, propõe um Estado israelita mínimo (uma pequena faixa costeira com menos de 20 km de largura, representando apenas 5% da Palestina), um Estado árabe e o restante território, incluindo Jerusalém, permanecendo sob mandato britânico. Essa proposta é também rejeitada, sobretudo pelos judeus. Em 1936-38 há violentas insurreições muçulmanas contra a imigração judaica. Os britânicos lançam em 1939 um Livro Branco sobre a questão e restringem bastante essa imigração.
Portanto, o problema de Israel não surge apenas no fim da 2ª GM. Na década de 1930 já muitos milhares de judeus se encontravam na Palestina, sendo já cerca de metade da população em 1945. Desde 1905 que a Palestina era o objectivo único dos sionistas e em 1945 estavam muito perto de o conseguir. Ou seja, dificilmente aceitariam outra solução, na Europa ou noutro continente.
Aliás, nessa época não lhes foi “dado” um território, foi reivindicado e conquistado por meios violentos, face aos britânicos e face aos vizinhos árabes. Esse é um erro comum em Portugal, dizer que os ocidentais deram um território aos judeus após a 2ª GM. Na verdade, desde a década de 30 que os judeus pressionavam fortemente os britânicos, num clima de quase-guerra de independência em que se destacava a Haganah - que significa A Defesa -, milícia que procurava defender de (e, dizem alguns, atacar a) britânicos e árabes, o que levou ao tal Livro Branco de 1939. Não quero com isto dizer que concordo nem que não concordo com a criação do Estado de Israel (lá chegarei mais à frente), mas apenas frisar que a sua história não começa em 1945 e que a sua criação não foi uma mera benesse dos países ocidentais. Os judeus estavam preparados para combater pela independência se as Nações Unidas não tivessem aprovado o Plano de Partilha de 1947! E provavelmente teriam ganho essa guerra face aos britânicos, como a ganharam no ano seguinte face aos árabes.
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O que acho da existência do Estado de Israel? Se estivéssemos em 1890, a minha resposta seria fácil: o sionismo não é aceitável. Ocupar progressivamente um território de outrém com o objectivo de o dominar não é aceitável. No entanto, desde os anos 30 que a única solução possível é a da existência de dois Estados. Esperemos que não demore muito porque quanto mais demorar, mais a região e o mundo sofrerão com isso. (Continua)
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O que acho da existência do Estado de Israel? Se estivéssemos em 1890, a minha resposta seria fácil: o sionismo não é aceitável. Ocupar progressivamente um território de outrém com o objectivo de o dominar não é aceitável. No entanto, desde os anos 30 que a única solução possível é a da existência de dois Estados. Esperemos que não demore muito porque quanto mais demorar, mais a região e o mundo sofrerão com isso. (Continua)
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