2.3.11

The Third Man, autobiografia de Peter Mandelson




Para quem não o conhece, Peter Mandelson foi uma eminência parda do New Labour (nem sempre muito parda, diga-se). Foi o "spin doctor" de serviço, o manobrador de bastidores, o sargento a pôr discretamente as tropas na ordem.



O título da sua autobiografia, "The Third Man", remete para tudo isso: era o terceiro homem, depois de Tony Blair e de Gordon Brown.



Mandelson acompanhou os dois desde cedo, muito antes de Blair chegar à liderança do partido. Acompanhou o percurso dos dois amigos, viu Brown a ser apontado como futuro líder durante anos e anos, espantou-se com a ascensão imparável de Blair na recta final. Tentou acalmar um frustradíssimo Brown e servir de ponte entre ele e Blair. Mas Brown nunca deixou de desconfiar que Mandelson o traiu em favor de Blair, o que ele nega veementemente.

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Com a chegada do Novo Trabalhismo ao poder, assumiu cargos governamentais de apoio próximo ao Primeiro-Ministro mas de nebulosa definição. Blair pedia-lhe simplesmente que fosse Peter, isto é, que participasse na definição da comunicação do Governo, que tratasse dos assuntos quentes, que fechasse as negociações complicadas, mas sem um cargo executivo típico. Que manobrasse nos bastidores movendo energias para atingir objectivos de outros e não às claras numa função ministerial mais tradicional.
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Este é um dos pontos mais interessantes de todo o livro. Perpassa aí uma frustração por não se conseguir libertar da imagem de homem do backstage nem, consequentemente, conseguir ser visto seriamente como estratega político ou como implementador de políticas. Nunca conseguiu libertar-se da imagem de mestre em politics, mas não em policies.



Numa opinião muito pessoal, não fica nada claro que essa imagem seja injusta. De facto, ao longo de toda a obra, Mandelson dedica muito mais tempo às manobras políticas que às discussões ideológicas, muito mais tempo às lutas internas do partido que às reformas estruturais do Governo, muito mais tempo ao seu relacionamento com outros protagonistas políticos da época do que às suas estratégias governativas, muito mais tempo ao sound-byte que ao pensamento estruturado. Mesmo o seu grande êxito político, a sua participação no processo de paz na Irlanda, foi uma participação mais de negociador fora dos holofotes mediáticos do que de implementador de políticas públicas.



Portanto, queixa-se de ser visto injustamente como manobrador-mor mas acaba por dedicar a maior parte das páginas a descrever como foi manobrador-mor.



Note-se que este qualificativo não é necessariamente negativo. Nessa tarefa ele seria provavelmente brilhante - e não é uma tarefa fácil. Provavelmente livrou Blair de muitas dores de cabeça. Deu um impulso fundamental às negociações no Ulster. Foi o único que conseguiu travar e, mesmo, inverter um pouco as tendências de descida de Gordon Brown primeiro-ministro.



Mas fica clara a amargura que sentiu por não ser reconhecido como um estratega político, um ministro competente, um homem de Estado.



O outro aspecto interessante deste livro é a perspectiva próxima, muito próxima, do que foi o New Labour e, nomeadamente, das relações nos círculos políticos restritos dos dois primeiros-ministros. Podemos acompanhar toda a História do trabalhismo inglês da viragem do século, conhecer os protagonistas, dissecar as rivalidades e as lutas internas, conhecer o funcionamento dos governos de então, perceber melhor o fim de Blair e de Brown.



Pelo meio, várias dicas sobre como sobreviver na Política mediatizada actual. Um bom exemplo? "Nunca ir falar com os jornalistas sem ter uma boa história preparada para lhes dar".



A ler, decididamente.