22.8.10

As Verdes Colinas de África

Desilusão.

De Hemingway espera-se sempre uma obra-prima e esta não o é. Esclareça-se que não é uma obra de ficção, mas sim uma descrição de uma temporada de caça em África.

Antes desta obra só tinha lido as 3 principais de Hemingway: Um Adeus às Armas, Por Quem os Sinos Dobram e O Velho e o Mar. São três obras fantásticas. Sim, já aí Hemingway era parco nos adjectivos. Sim, já nesses livros não se alonga a descrever emoções, antes as deixa subentendidas nas descrições dos acontecimentos. Sim, já aí gosta de frases curtas. Mas neste livro leva esse esforço de despojamento ao nível do soporífero. Quem já estiver estado numa caçada em África, talvez goste. Quem nunca lá esteve, aborrece-se com cada detalhezinho de cada momento de cada caçada, com pouco mais de humano para nos relacionarmos.

Pelo meio há umas considerações sobre literatura, que se limitam a umas tiradas de linha e meia, tipo twitter.

- "O que pensa de Ringelnatz?"
- "É maravilhoso".
- "Com que então gosta de Ringelnatz. Óptimo. E o que pensa de Heinrich Mann?"
- "Não vale nada".
- "Acha?"
- "O que sei é que não consigo lê-lo".

E pronto, passa para o autor seguinte. Lá há um ou outro sobre o qual se detém mais, mas a maior parte é neste estilo telegráfico. Por vezes é bastante ácido, quer com escritores à época bem vivos, quer com alguns dos seus leitores-admiradores (a começar pelo seu interlocutor, com ares de pretendente parvo a literato), mas sempre no mesmo registo.

É aqui que surge uma tirada de Hemingway que é muito citada, sobre Mark Twain:

- "Toda a moderna literatura americana vem de um livro de Mark Twain chamado Huckleberry Finn. Se o ler, deve parar onde o negro Jim é roubado aos rapazes. Aí é realmente o fim. O resto é uma fraude. Mas é o melhor livro que até à data tivemos. Todos os escritores americanos provêm daqui. Não há nada antes. Não houve nada tão bom depois."

Não é a mais exaustiva nem penetrante análise de Huckleberry Finn, mas é das mais assertivas. Bom soundbyte, bom twit, diríamos hoje. Pouco mais.

Isto vem logo no início e é retomado mais para a frente, sem resultados melhores. Depois, longas descrições de caçadas (tanto que para mim mais valia retirar a cedilha). Recomendo ler na cama, antes de deitar.


Só o último capítulo é que me agradou mais, sem nunca deslumbrar. Tem uma descrição mais viva, mais entusiasmante, talvez por ser o capítulo do triunfo. Deixa mais de lado os meandros da caçada e explora mais a relação com os nativos e os acompanhantes, incluindo a inveja causada pelo amigo que abateu caça maior. Mas, sendo melhor, nunca chega aos calcanhares de Por Quem os Sinos Dobram ou de O Velho e o Mar.

(Nota para mim próprio: ler o Huckleberry Finn :)

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